domingo, 7 de outubro de 2007

Clarice Lispector

Saudade é um pouco como fome. Só passa quando se come a presença. Mas às vezes a saudade é tão profunda que a presença é pouco: quer-se absorver a outra pessoa toda. Essa vontade de um ser o outro para uma unificação inteira é um dos sentimentos mais urgentes que se tem na vida.

Não entendo.Isso é tão vasto que ultrapassa qualquer entender.Entender é sempre limitado.Mas não entender pode não ter fronteiras.Sinto que sou muito mais completa quando não entendo.Não entender, do modo como falo, é um dom.Não entender, mas não como um simples de espírito.O bom é ser inteligente e não entender.É uma benção estranha, como ter loucura sem ser doida.É um desinteresse manso, é uma doçura de burrice.Só que de vez em quando vem a inquietação: quero entender um pouco.Não demais: mas pelo menos entender que não entendo.


"Eu te odeio", disse ela para um homem cujo crime único era o de não amá-la. "Eu te odeio", disse muito apressada. Mas não sabia sequer como se fazia. Como cavar na terra até encontrar a água negra, como abrir passagem na terra dura e chegar jamais a si mesma?


É difícil perder-se. É tão difícil que provavelmente arrumarei depressa um modo de me achar, mesmo que achar-me seja de novo a mentira de que vivo.

E se me achar esquisita,respeite também.até eu fui obrigada a me respeitar.


...e ela cada vez maior, vacilante, túmida, gigantescase conseguisse chegar mais perto de si mesma, ver-se-ia inda maior...e em cada olho podia-se-lhe mergulhar dentro e nadar sem saber que era um olho...


É curioso como não sei dizer quem sou. Quer dizer, sei-o bem, mas não posso dizer. Sobretudo tenho medo de dizer porque no momento em que tento falar não só não exprimo o que sinto como o que sinto se transforma lentamente no que eu digo."

"Minha alma tem o peso da luz. Tem o peso da música. Tem o peso da palavra nunca dita, prestes quem sabe a ser dita. Tem o peso de uma lembrança. Tem o peso de uma saudade. Tem o peso de um olhar. Pesa como pesa uma ausência. E a lágrima que não se chorou. Tem o imaterial peso da solidão no meio de outros."

"O amor é tão mais fatal do que eu havia pensado, o amor é tão mais inerente quanto a própria carência, e nós somos garantidos por uma necessidade que se renovará continuamente. O amor já está, está sempre. Falta apenas o golpe da graça - que se chama paixão."

"Tenho várias caras. Uma é quase bonita, outra é quase feia. Sou um o quê? Um quase tudo."

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